Por Edmilson Costa, via Cemarx
A globalização em curso na economia mundial vem provocando um conjunto de fenômenos novos em toda a vida social da humanidade – na economia, na política, nas relações capital-trabalho, na cultura e nas tradições dos povos. Portanto, trata-se de um processo que coloca para todos os marxistas uma série de questões novas, bem como o desafio de procurar compreender os dados dessa realidade de uma forma aberta, não dogmática, visando extrair desse fenômeno as conseqüências analíticas e teóricas desta fase do capitalismo contemporâneo.
A globalização representa hoje uma fase nova do capitalismo, período em que este modo de produção atingiu plenamente seu amadurecimento e se transformou num sistema mundial completo. Até o período anterior à globalização, o capitalismo era completo apenas em relação a duas variáveis da órbita da circulação – o comércio mundial e a exportação de capitais. Mas, ao expandir a mundialização para as esferas produtiva e financeira, bem como para os outros setores da vida social, o sistema unificou globalmente o ciclo do capital, fechando assim um processo iniciado com a revolução inglesa de 1640 (Costa, 2002).
Até meados da década de 50, a burguesia dos países centrais capturava a mais- valia dos países periféricos na órbita da circulação, por meio do comércio internacional ou da exportação de capitais. No entanto, após a internacionalização da produção, a burguesia dos países centrais deu um salto de qualidade: passou a criar generalizadamente o valor fora de suas fronteiras nacionais [1], descentralizando assim o ambiente de apropriação direta da mais-valia, num movimento que envolve atualmente todo o planeta. Com a criação e apropriação do valor em escala global, a burguesia dos países centrais tornou-se, pela primeira vez na história do capitalismo, uma classe exploradora direta do conjunto do proletariado mundial. Além disso, ao produzir internacionalmente e internacionalizar também as finanças, o modo de produção capitalista amadureceu efetivamente a reprodução do capital em escala internacional, possibilitando a constituição de um ciclo mundial único na economia mundial.
Os resultados mais visíveis da globalização da produção são os novos ramos industriais, como as tecnologias da informação, a microeletrônica, a robótica, a engenharia genética, a nanotecnologia e a biotecnologia, a internet, entre outros, cuja configuração possibilitou ao capitalismo reestruturar o sistema produtivo e iniciar uma terceira revolução industrial. Esses novos ramos produtivos, a exemplo do que ocorreu no passado, estão substituindo os velhos setores típicos da segunda revolução industrial, como o metal-mecânico, plástico e químico e se transformando nos pólos dinâmicos da nova produção capitalista. A indústria dos tempos atuais já começa a desenhar um perfil inteiramente diferente do passado recente e seu desenvolvimento no futuro não muito distante terá grande impacto na vida social, em todos os seus domínios. A classe operária da terceira revolução industrial terá um perfil inteiramente novo: será uma classe polivalente, mais qualificada e mais instruída, devendo a ela se incorporar a nova categoria dos cientistas assalariados dos novos ramos industriais (os ferramenteiros dos chips, os engenheiros da genética e da biotecnologia, os web designs da internet, os físicos da nanotecnologia), fatos que terão profundas repercussões na luta de classe em nível mundial.
Com a globalização financeira, a órbita das finanças passou a hegemonizar toda a dinâmica do sistema capitalista. Para se ter uma idéia da magnitude do mercado financeiro mundial, basta dizer que hoje circula diariamente nas várias praças mundiais cerca de US$ 1,8 trilhão de dólares (Roberts, 2000) e a massa de capitais em operação nos mercados financeiros já alcança US$ 118 trilhões (Mckinsey, 2005), montante correspondente a mais de duas vezes o PIB mundial. Essa massa de recursos basicamente especulativos tem a possibilidade de se movimentar pelo mundo ao longo das 24 horas do dia. O capital especulativo conseguiu romper a barreira do espaço e do tempo ao se auto-acrescentar continuamente, fenômeno que lhe proporcionou relativa autodeterminação nunca vista na história do capitalismo e transformou as atividades desta área na principal arena de negócios do sistema capitalista.
Essa imensa massa de recursos, totalmente desregulamentada, tem a capacidade de mudar decisões dos Bancos Centrais, alterar as políticas econômicas governamentais, as políticas sociais e o mercado de trabalho (Chesnais, 1996). O mais grave é que a dinâmica especulativa, desligada de uma base material, cresce de maneira exponencial, aumentando a criatividade e a agressividade dos mercados financeiros, sendo que a própria dinâmica financeira realimenta o frenesi especulativo.
No entanto, a globalização atual é um fenômeno que nasce sem a possibilidade de se viabilizar plenamente, ao contrário da primeira e da segunda revolução industrial, em função das limitações estruturais do modo de produção capitalista nesta etapa da história. A terceira revolução industrial possibilitou ao sistema inovações tecnológicas radicais que proporcionaram às forças produtivas um enorme desenvolvimento. No entanto, o capital não possui atualmente condições para desenvolver plenamente todo o seu potencial produtivo, em função da insuficiência global de demanda. Ou melhor, quanto mais o capitalismo tem possibilidades potenciais de desenvolver suas forças produtivas, em conseqüência da inserção de ciência na produção, mais sua ação está limitada por suas próprias contradições.
A inserção de tecnologia sofisticada na produção e a nova gestão empresarial possibilitaram a reestruturação da produção e do gerenciamento fabril, pouparam trabalho vivo nos centros dinâmicos da produção mundial, aumentaram a taxa de lucro e reduziram o poder do movimento sindical oriundo da segunda revolução industrial, mas em contrapartida encilharam o sistema num emaranhado de contradições, que se expressam mais claramente no fato de que cada unidade de trabalho vivo poupada representa uma nova dificuldade para a realização das mercadorias, colocando em conflito estratégico a questão produção-demanda.
Retoma-se assim, (só que agora em bases ampliadas), a contradição original do sistema, que se expressa entre o caráter social da produção e a apropriação privada de seus resultados.
Com a terceira revolução industrial, parece que o sistema se aproxima de um limite da reprodução enquanto potencialidade material, uma vez que se o capitalismo chegasse a produzir de acordo com suas potencialidades haveria uma crise de superprodução. Mesmo levando em conta a produção destrutiva (material bélico e semelhantes) ou os gastos governamentais em mercadorias inúteis socialmente, a globalização emerge num momento em que a crise está instalada tanto no setor produtivo, quanto agrícola ou de serviços, posto que a alavancagem desses setores não encontraria demanda solvável para suas mercadorias.
Isso explica o fenômeno da financeirização da riqueza, que se apresenta como o contraponto funcional da incapacidade do sistema desenvolver plenamente as suas forças produtivas. Os capitais excedentes, impedidos de se reproduzirem na esfera produtiva, buscam agora desesperadamente uma fuga para a frente na órbita da especulação. Nesta nova aventura desesperada, o capital especulativo carrega consigo todos os outros setores do capital para a lógica da órbita financeira e, com esse movimento, aprofunda a crise geral do capitalismo, pois no longo prazo é impossível a reprodução do capital, sem obedecer a lei do valor.
A criação da riqueza majoritariamente na órbita financeira é uma aventura sem futuro, uma miragem capaz de levar, no curto prazo, os capitalistas ao delírio e ofuscar sua visão global. No entanto, quanto mais aprofundam esse modelo, mais ampliam as possibilidades de uma crise maior do sistema. Como a história tem demonstrado, quanto maior o descolamento entre a esfera de criação do valor (a produção) e órbita da circulação (especialmente o setor parasitário da especulação financeira), mais severa e destrutiva tende a ser crise do sistema. Portanto, a globalização, mesmo sendo um dado da realidade, tem seus limites estruturais oriundos da própria lógica do capital.
Ressalte-se a esse respeito que Lênin, o mais genial quadro teórico do século XX, escreveu que o imperialismo seria a ante-sala do socialismo. Todavia, parece que houve certo otimismo nesta previsão, uma vez que naquela época o capitalismo monopolizado estava apenas iniciando o seu processo de amadurecimento internacional, não reunindo, portanto, as condições plenas para as transformações dialéticas que viriam a ocorrer com a globalização. Somente agora o capitalismo fecha o ciclo do seu desenvolvimento histórico. Nessa perspectiva, pode-se dizer que agora estamos muito mais próximos de uma transformação radical desse modo de produção do que no início do século XX.
Como tudo na natureza segue a lei da dialética, podemos afirmar que o sistema capitalista teve seu desenvolvimento efetivo com a revolução industrial, passou por uma fase superior com a segunda revolução industrial e amadureceu completamente com a globalização contemporânea. Portanto, agora que já cumpriu o papel histórico de desenvolver internacionalmente as forças produtivas e a órbita da circulação, tende a sofrer transformações profundas que mudarão a sua qualidade enquanto modo de produção, a exemplo do que ocorreu com as outras formações sócioeconômicas anteriores.
Seu aparente esplendor globalizado esconde um conjunto de contradições originais que se reproduzem agora em bases ampliadas com a globalização. Portanto, para compreender o fenômeno da globalização e as possíveis transformações de um sistema agora completo deve-se também atentar para o fato de que uma transformação qualitativamente nova só poderá ser efetiva se for viabilizada a partir do coração do sistema, onde potencialmente a luta de classes tem condições de pulsar mais intensamente.
É bem verdade que os elos débeis continuarão cumprindo um papel essencial para o enfraquecimento geral do capital, enquanto forma global de dominação. Mas a sua crise profunda só poderá configurar um estatuto terminal quando atingir o núcleo do poder, o coração da Tríade Imperial. Em outras palavras: a crise geral do capitalismo só estará madura quando atingir os Estados Unidos, a União Européia e o Japão.
Os clássicos e o imperialismo
Desta forma, estamos diante de um conjunto de fenômenos novos. Resta saber se esses fenômenos configuram uma mudança de patamar da história do capitalismo ou se trata apenas de uma evolução natural das forças produtivas.
Entendemos que estamos vivenciando uma nova fase do capitalismo, semelhante à que ocorreu no final do século XIX, início do século XX, com a fusão do capital bancário e industrial e a emergência dos monopólios. Sinteticamente, estes fatos podem demonstrar esta tese:
a) a globalização produtiva alterou o lócus de extração do valor, a partir do qual a burguesia dos países centrais passou a capturar, de maneira generalizada, a mais- valia fora de suas fronteiras nacionais. Os velhos monopólios transformaram-se em destacamentos avançados do grande capital, estando hoje presentes fisicamente em todos os continentes;
b) o processo de fusões e aquisições não só se assemelha ao passado, como indica uma cosmopolitização burguesa, se não ainda em termos mundiais, pelo menos do ponto de vista dos blocos econômicos;
c) o comércio intra-firma responde atualmente por cerca de 40% do comércio mundial, fato que subverte as chamadas vantagens comparativas, uma vez as relações comerciais passam a ser baseadas exclusivamente no interesse das corporações transnacionais;
d) na área financeira, a lógica da especulação subordinou todas as outras atividades econômicas, inclusive o setor produtivo e os orçamentos nacionais (Plihon, 1998), ressaltando-se que o capital especulativo pode hoje movimentar-se online 24 horas por dia, o que quebra as barreiras do espaço e do tempo, situação que nem mesmo os mais delirantes especuladores sonhavam há duas décadas.
Os fenômenos que procuramos identificar não se referem apenas à evolução natural do sistema capitalista, mas constituem uma situação qualitativamente nova. Assim, estamos num ambiente em que as teorias que expressavam os fenômenos relativos à segunda revolução industrial não respondem mais plenamente à conjuntura objetiva da globalização. Isso significa que as teorias elaboradas pelos clássicos do imperialismo (Hobson, Bukharin, Rosa de Luxemburgo, Kaustky, Hilferding e Lenin) já não podem mais explicar plenamente os fenômenos da globalização. Eles escreveram sobre seu tempo; não tinham obrigação, nem estavam interessados em adivinhar o futuro. Mas o lastro em que desenvolveram as teorias e o método dialético são fonte fértil para que os marxistas de nossa época deem prosseguimento à sua obra teórica.
Elegendo a obra de Lenin, O imperialismo, fase superior do capitalismo, como síntese paradigmática da interpretação do imperialismo oriundo da segunda revolução industrial, procuraremos analisar os eixos fundamentais daquela obra para aferirmos qual a aderência que ainda possui à realidade atual. Lênin elencou cinco traços fundamentais que caracterizavam a nova fase do capitalismo: 1) a concentração da produção e do capital e o aparecimento dos monopólios; 2) a fusão do capital industrial com o capital bancário e o aparecimento da oligarquia financeira; 3) a exportação de capitais, ao contrário da exportação de mercadorias; 4) a formação das associações monopolistas que partilharam economicamente o mundo entre si; 5) a partilha territorial do mundo entre as potências mais importantes (Lenin, passim, 1975).
Lênin enfatizou ainda que o imperialismo não era uma nova formação sócioeconômica, mas a fase superior do capitalismo. Nesse sentido, afirmava que esta fase seria marcada pelo capitalismo parasitário, em decomposição e agonizante, a ante-sala do socialismo. Vejamos como se apresenta cada uma dessas características no mundo atual:
A concentração da produção e do capital continuam sua marcha histórica, como Marx já havia identificado anteriormente, baseado na própria lógica da acumulação. No entanto, o que distingue a época atual do período de Lênin é que as corporações transnacionais passaram a extrair diretamente, e de maneira generalizada, o valor fora de suas fronteiras nacionais, tornando a burguesia dos países centrais exploradora direta do proletariado mundial, ao contrário do que acontecia anteriormente quando se apropriava da mais-valia mediante o comércio mundial ou a exportação de capitais.
Em conseqüência da globalização, impôs-se ao grande capital a necessidade de uma remonopolização global, através de um processo intenso de mega-fusões e incorporações em todos os seus estamentos – industrial, bancário e de serviços. Isso está dando um caráter novo à luta pela hegemonia entre os blocos do grande capital: precisam unificar novamente sua estratégia, não só para reorganizar-se diante da globalização, impor uma nova disciplina ao mundo do trabalho, mas principalmente para contrarrestar a tendência decrescente da taxa de lucro que caracterizava a conjuntura mundial após a Segunda Guerra.
A exportação de capitais hoje difere significativamente do período da segunda revolução industrial e mesmo no período de ouro do Walfare State. No período inicial do imperialismo, a exportação de capitais era destinada à construção de estradas de ferro, minas, portos e outros equipamentos de infra-estrutura, sem que houvesse grandes inversões na área fabril, até mesmo porque não era interessante para os países centrais a industrialização da periferia. Isso pode ser constatado pelo fato de que apenas alguns desses países conseguiram realizar sua industrialização, assim mesmo muito tardiamente. Somente com a internacionalização da produção é que os capitais migraram para a construção de plantas fabris nos países da periferia, mas aí já se tratava de um processo novo, a globalização da produção.
Outro fenômeno que chama a atenção na exportação de capitais da atualidade é o fato de que cerca de 80% do investimento direto externo (IDE) não está direcionado aos países da periferia, mas aos países centrais, ressaltando-se ainda que vem decrescendo a participação dos países periféricos neste tipo de investimento (Chesnais, 1996; World Investment Report, 2001). Se a exportação de capital está se desenvolvendo centralmente entre os próprios países imperialistas, a relação de subordinação pode ter uma nova leitura, e não deve ficar restrita à tradicional subordinação entre os países imperialistas do passado e suas colônias ou nações satélites. É bem verdade que a subordinação é a lógica da relação centro-periferia, mas o montante de recursos dessas operações direciona o centro do fenômeno para outras regiões e não para a periferia.
Todavia, o aspecto mais importante da exportação de capitais hoje não se verifica na esfera produtiva, mas essencialmente na órbita financeira. A partir do final dos anos 60, constata-se crescentemente a privatização da liquidez internacional, ao contrário do período anterior, quando a maioria dos empréstimos era oriunda de entidades financeiras multilaterais. Essa privatização foi fruto de um movimento do capital norte-americano no sentido de burlar as leis restritivas a saídas de capitais do País. Para tanto, os bancos começaram a criar títulos com valor em dólar americano, mas emitidos fora dos EUA, mecanismo que foi crescendo como uma bola de neve e formando um peculiar mercado de moedas, que posteriormente transformaria a Europa e, especialmente, Londres, no principal centro financiador das atividades mundiais (Moffit, 1984).
É importante ressaltar que, com o mercado de eurodólares, processa-se uma mudança profunda na exportação de capitais, movimento que viria se expressar mais claramente com o endividamento dos países da periferia. Posteriormente, com a desregulamentação do período Reagan-Tatcher, a exportação de capitais tomaria um novo rumo. A transformação qualitativa do IDE em instrumento para a realização de fusões e aquisições dá um sentido novo à exportação de capitais. “Para ampliar os lucros a oligarquia financeira mudou o seu centro de gravidade, reduzindo os investimentos diretos na produção, o que amplia o caráter parasitário do imperialismo” (Costa, 1989). Se o centro de gravidade da exportação de capitais já estava alterado com a formação da dívida externa dos países da periferia, a desregulamentação veio intensificar de maneira extraordinária esse processo.
A partilha econômica e territorial do mundo também se desenvolve de maneira bastante diferenciada do período inicial do imperialismo. Está em curso, com uma série de problemas, a formação dos blocos econômicos nas principais regiões do mundo. Estes blocos refletem, de um lado, os problemas e contradições da luta inter-burguesa e do desenvolvimento desigual capitalismo, e de outro, uma surda luta de resistência contra a tentativa norte-americana de construir uma ordem unipolar, tendo a nação yanque como centro. Como se trata de um processo em construção, não se pode visualizar ainda o desfecho definitivo. Mas, de qualquer forma, a partilha territorial do mundo hoje tem aspectos radicalmente diferentes dos tempos dos primeiros monopólios.
Registre-se que há uma desesperada dos Estados Unidos no sentido de se transformar numa potência hegemônica incontestável e, a partir desta posição, tirar o máximo proveito da nova ordem econômica internacional e realizar uma recolonização sofisticada dos países da periferia. Trata-se de uma recolonização que não inclui a ocupação geográfica no sentido clássico (a não ser em regiões rebeldes, ou ainda onde for determinante para os interesses americanos, como atualmente no Iraque ou futuramente na Amazônia), mas a busca do controle econômico-financeiro dessas regiões.
Finalmente, a tendência à decomposição e ao parasitismo, identificado por Lenin como sendo uma das características da oligarquia financeira, mantém a sua essência, mas foi aprofundada de maneira extraordinária e revela aspectos novos e relevantes. A oligarquia financeira ampliou o seu parasitismo e muitos Estados imperialistas transformaram-se em nações rentistas (Chesnais, 2000). Circula hoje diariamente na órbita financeira US$ 1,8 trilhão (Roberts, 2000) e o montante de negócios nesse segmento é de US$$ 118 trilhões, duas vezes o PIB mundial (Mckinsey, 2005). A transferência de recursos dos países da periferia para os países centrais nos últimos 25 anos, por conta principalmente dos mecanismos impostos pelo capital financeiro, pode ser considerada semelhante à extorsão realizada no período colonial, o que por si só dá uma dimensão do rentismo institucionalizado de nossa época.
Como se sabe, a financeirização da riqueza ou o rentismo institucionalizado, é uma expressão degenerada da acumulação de capitais e demonstra um aprofundamento sem precedentes do parasitismo da nova burguesia. A “valorização” da riqueza pela via financeira cria uma contradição entre a velocidade de expansão da órbita financeira e o crescimento do setor produtivo, tornando assim a defesa da riqueza por esta via uma aventura sem futuro, pois haverá inevitavelmente um momento de ruptura desse processo para compatibilizá-lo com a economia real, o que deverá ter conseqüências dramáticas tanto para especuladores quanto para a ordem econômica capitalista.
Paradoxalmente, a globalização está construindo as bases para a sociedade da abundância, em função da terceira revolução industrial e do aumento da produtividade do trabalho. “Mas como o capitalismo não tem compromisso com o progresso social, não será capaz de satisfazer as necessidades da população do planeta. Mesmo assim, essas forças produtivas sofisticadas, pela primeira possuem condições de dar lastro para a sociedade da abundância de bens e serviços. Caso a humanidade obtenha uma transformação estrutural do capitalismo, já possui as bases materiais da sociedade comunista” (Costa, 1993).
NOTA:
[1] Michalet. C. Albert. Capitalismo Mundial. São Paulo: Paz e Terra, 1984. Este autor foi o primeiro a identificar a criação do valor fora das fronteiras nacionais dos países centrais, mas sua análise não se referia ao processo de globalização atual.
BIBLIOGRAFIA:
CHESNAY, François. A mundialização do capital. São Paulo: Xamã, 1996
_________________ (Org.). A Mundialização Financeira. São Paulo: Xamã, 1998.
COSTA, Edmilson. A globalização neoliberal e as novas dimensões do capitalismo contemporâneo. Tese de Pós-doutoramento. Instituto de Filosofia e Ciências Humanas – Unicamp, 2002.
________________. Imperialismo. 2a. Ed. São Paulo: Global, 1989.
LENIN, Vladimir. Imperialismo, fase superior do capitalismo. Lisboa: Edições Avante, 1975.
MCKINSEY COMPANY. U$ 118 trillion and counting: taking stock the world ́s capital markets. 2005. http//:www. mckinsey.com. Acesso em 5/72005.
MICHALET, Charles Albert. Capitalismo Mundial. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1984.
MOFFIT, Michel. O dinheiro do mundo – de Bretton Woods à beira da insolvência. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1984.
PLIHON, Dominique. Desequilíbrios mundiais e instabilidade financeira: a responsabilidade das políticas liberais. Um ponto de vista keynesiano. In A mundialização financeira. São Paulo: Xamã, 1998.
ROBERTS, Richard. Por dentro das finanças internacionais. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editores, 2000.
UNCTAD (United Nations Conference on Trade and Development). World Investment Report, 2001.