Sobre a reprodução da militância, as tarefas organizativas e a divisão sexual do trabalho – “olhar o mundo com olhos de mulher”

Por Isadora Maria Nardes Gomes[1]

“O trabalho de organização também é resistência” talvez seja a única fala importante da personagem de Clara Charf no filme Marighella (2019), de Wagner Moura. Dentre os problemas do filme, talvez o que seja mais marcante para as camaradas e companheiras que assistiram, é a perpetuação da figura do revolucionário – ou, de forma mais abrangente, do sujeito histórico revolucionário – como uma figura masculina. Essa breve reflexão se pretende uma síntese e um ponto de partida para pensar a materialidade das mulheres militantes dentro de seus espaços de organização de classe, especialmente as tarefas as quais lhe são tradicionalmente colocadas.

“A participação de mulheres em espaços políticos” é, por si só, uma expressão vazia de quem são essas mulheres, o que é essa participação e quais são esses espaços políticos. Talvez se pudesse partir da democracia ateniense pra explicar a segregação da mulher dos espaços de poder; talvez se pudesse, também, partir de uma historiografia burguesa e branca. “As mulheres foram às ruas pelo direito de trabalhar e ter independência política e financeira” – é o que ouvimos na trajetória acadêmica como uma versão progressista dos fatos que se sucederam durante os séculos XVIII, XIX e XX. Entretanto, encontrar o lugar dessa particularidade da mulher militante dentro da totalidade nos exige uma análise mais cuidadosa. Uma análise que demonstre que as mulheres da nossa classe (e, nos países onde se usou força-de-trabalho escravizada das nações africanas, seria um erro não frisar as mulheres pretas da nossa classe) sempre trabalharam.

O que se costuma identificar como “papel social” atribuído ao gênero feminino, de cuidado doméstico, não é algo que foi imposto pelo patriarcado como meramente um conjunto de ideias sobre o que é ser mulher, mas uma expressão ideológica da forma como a materialidade se demonstrou através de alguns séculos nas sociedades de classe: a responsabilidade da reprodução social da vida.

As condições primordiais necessárias para a continuidade da existência humana são as que geram e são perpetuadas pela produção e reprodução social da vida. Comer, vestir e morar são o que sustentam a existência de uma força-de-trabalho; é o modo de produção no qual essa força de trabalho existe que define qual será o seu caráter e como será organizada a manutenção dessas necessidades básicas para sua perpetuação. À manutenção dessas necessidades básicas, damos o nome de reprodução social da vida – ou, de forma específica, reprodução social do trabalho.

É necessário para reprodução social da vida a reprodução da força de trabalho – em outras palavras, o trabalho reprodutivo é tanto a formação de nova força de trabalho (a geração de novos trabalhadores, ou seja, a criação de filhos, o trabalho materno), quanto a reprodução da já existente força-de-trabalho.

Tendo em mente que foi e é parte central da vida das mulheres trabalhadoras e historicamente atribuído a nós o papel de reprodução da força de trabalho, podemos começar a compreender porque, mesmo quando assalariado, os trabalhos que mais se assemelham ao âmbito doméstico – e, mais ainda, os trabalhos da “economia do cuidado”  – ainda são, de forma hegemônica, feitos por nós. O próprio assalariamento  nos coloca, novamente, na condição doméstica.[2] No prefácio de A classe operária tem dois sexos, se explicita o fenômeno da seguinte forma:

“(…)  assiste-se a partir dos anos 1990 à expansão dos ofícios relacionados ao care (cuidados), isto é, à mercantilização e à externalização de um trabalho tradicionalmente alocado às mulheres na esfera dita “privada”, no seio da família, trabalho tradicionalmente gratuito e realizado “por amor”: o cuidado da casa, das crianças, dos idosos, dos doentes” (Blass, Hirata & Soares, 2010)

Entretanto, Saffioti identifica a tendência já no começo do século XX:

“(…) mulheres das camadas subprivilegiadas encontravam trabalho como empregadas domésticas em residências, como lavadeiras, passadeiras, doceiras, costureiras etc. (…) A sociedade de então colocava a jovem originária de estrato médio diante de restritas opções: ser professora primária, enfermeira ou parteira. A concessão que a sociedade fazia resumia-se, portanto, em permitir que a mulher praticasse fora do lar funções que já desempenhava no interior da própria família, de maneira empírica. Um pouco de qualificação profissional permitia prestar a outros seres humanos serviços que a mulher, em certa medida, devia oferecer aos membros de sua família.” (Saffioti, 1982)

Há de se acrescentar, também, que o trabalho de reprodução social não é simplesmente um trabalho mecânico e braçal de lavar, passar, cozinhar, arrumar. A dimensão organizativa do trabalho doméstico é o ponto no qual vamos nos atentar. O trabalho de “gerenciamento” doméstico e de organização da reprodução da vida é o que mantém a materialidade da família mononuclear burguesa funcionando – é esse trabalho mental que mantém uma casa como um lar, em termos vulgares. O trabalho doméstico não pesa para as mulheres trabalhadoras apenas na medida de uma exploração física de seus corpos e de seu tempo, mas também na dimensão de uma carga mental gerada pela responsabilidade desse gerenciamento para dar conta de todos os membros da família. Lenin enxergava o fenômeno da seguinte forma:

“A mulher, não obstante todas as leis libertadoras, continua uma escrava doméstica, porque é oprimida, sufocada, embrutecida, humilhada pela mesquinha economia doméstica, que a prende à cozinha, aos filhos e lhe consome as forças num trabalho bestialmente improdutivo, mesquinho, enervante, que embrutece e oprime.” (Lenin, 1919)

A realidade de exploração do trabalho doméstico atrelada a um feminismo pautado em historiografia burguesa leva a perspectivas, mais presentes na pós-modernidade, de uma moralização da exploração das mulheres. A ideia de “mulher guerreira” como um símbolo de uma capacidade feminina de dar conta da vida (ao mesmo tempo em que escamoteia as consequências concretas do que é essa guerra constante da mulher trabalhadora) é apenas um dos elementos do discurso. Atrelado, está a ideia, que circula entre setores da social-democracia, de “economia do cuidado”.

Em entrevista concedida à Gazeta do Povo em outubro de 2020 pela ex-candidata à Prefeitura de Curitiba Letícia Lanz (PSOL) podemos enxergar um exemplo da romantização do cuidado como atribuição feminina – e moralizante. Nas seguintes palavras: “(… ) defendo a ideia de ‘economia do cuidado’, como oposição à ‘economia do mercado’. A economia do cuidado é uma economia essencialmente feminina, sem a qual ninguém sobrevive. Eu e você, por exemplo, não estaríamos aqui agora se não tivesse havido alguém para cuidar de nós, dando alimento, trocando a roupa, limpando a casa – e todo esse trabalho não gera sequer um centavo de recompensa para as mulheres. O lucro buscado, na economia de cuidado, é o bem-estar das pessoas.”[3] Mesmo compreendendo que esse trabalho é um trabalho não pago, há algo de moral em saber cuidar, há algo inato nessa essência que nos permite zelar pelos outros. O discurso se complementa nos debates que houveram, no mesmo ano, em emissoras televisivas, nos quais a candidata fala que a participação de mulheres da política da cidade é importante para criar uma cidade acolhedora, que cuide das pessoas, porque mães sabem como cuidar, portanto seriam o motor dessa economia do cuidado.

“Olhar o mundo com olhos de mulher”  não é, de forma alguma, se entender como naturalmente apta ao cuidado, mas ser educada para assumir responsabilidade pelo cuidado e sentir culpa quando não o faz (e quando o faz).

Dentro da realidade das nossas organizações de classe, partimos para refletir sobre o papel material que as mulheres militantes exercem dentro da divisão revolucionária do trabalho. O problema do discurso de Lanz não é meramente a naturalização do papel da mulher como um papel de reprodução doméstica; o problema é o discurso como expressão da concretude na qual as mulheres exercem sua militância e as tarefas que lhes são atribuídas e se dispõe. Em outras palavras, o discurso é verdade, ainda que parcialmente. O discurso é verdade não porque é o desejo das mulheres militantes ou sua propensão natural ao cuidado de camaradas – ou pelo próprio sentimento de camaradagem, simplesmente – que as impele ao cuidado reprodutivo constante, mas porque não é comum que se dê a atenção devida a uma nova formulação de divisão revolucionária do trabalho.[4]

Para que haja a possibilidade de ocorrerem atividades diárias de uma organização política – reuniões, Ativos, participação em ocupações, construção de manifestações, fóruns, chapas de sindicatos e entidades estudantis, eleições, trabalhos de Brigadas e solidariedade –  são necessários  camaradas que organizem caronas, comidas e bebidas, espaço e assentos, limpeza (e, a ser abordado de forma mais cuidadosa em texto futuro, cuidado com as crianças), tudo relacionado ao bem-estar dos camaradas e companheiros em espaços coletivos de militância. Esse aspecto específico do bem-estar está dentro do aspecto geral que é o do trabalho organizativo – o que faz a militância acontecer, por assim dizer. A condução e relatoria de reuniões, elaboração de documentos, até tarefas como cuidar dos emails, da comunicação, os informes e repasses, os calendários – o que em um primeiro momento pode parecer mecânico e burocrático mas que, assim como o trabalho doméstico, tem uma dimensão de carga e sobrecarga mental.

Essas tarefas organizativas, de forma geral, podem ser caracterizadas como um tipo de reprodução do trabalho militante, reprodução social revolucionária – porque são necessárias para a continuidade de uma organização comunista que visa o poder popular. Não se faz um ativo de qualidade, uma reunião objetiva, uma ocupação que se sustente, etc, sem as tarefas organizativas funcionando com qualidade. Da mesma forma, sem uma linha política acertada, planejamento e profundidade em cada deliberação, as tarefas organizativas iriam carecer de sentido.

É fácil de observar que o trabalho de reprodução social revolucionária a qual nos referimos é geralmente delegado para e assumido por mulheres. Isso indica: 1. Ser um reflexo direto da socialização das mulheres trabalhadoras – sendo treinadas, desde meninas, a aprender o trabalho doméstico e ser responsáveis por ele, se colocando também muitas vezes de prontidão para essas tarefas; 2. A necessidade de gerar acúmulo, especialmente entre os camaradas homens, sobre o impacto que isso gera na militância e a importância de transformar essas condições.

Ao mesmo tempo, observamos que homens são mais incentivados a tarefas públicas de fala, de análise de conjuntura, de aparecimento e propaganda em espaços coletivos – tendo, por vezes, mais incentivo a se tornar propagandistas. Não podemos avaliar essa discrepância meramente como uma questão de “roubar” protagonismo ou de usufruir de privilégios sob as camaradas[5], mas como um problema a ser tratado de forma coletiva. A punição pura e simples, sem os esforços coletivos de superação dessa sociabilidade, não poderá, como dizia Lenin, construir algo que dure.

A decisão de transformar essas situações deve ser uma decisão ativa, e levada em vários pormenores. Não é possível simplesmente falar que precisamos de mais mulheres em tarefas de direção, agitação, propaganda, formulação teórica, e esperar que seja automático que elas ocupem essas tarefas. É necessário que as condições materiais para o desenvolvimento dessas tarefas sejam uma construção coletiva. Criar mecanismos reais e acúmulo real orgânico nas nossas bases para uma nova divisão revolucionária do trabalho, que seja feminista e emancipatória, é tarefa de cada militante e algo a ser pensado em cada instância.

É necessário que se compreenda que colocar homens em tarefas de “reprodução militante” – cuidar da alimentação, da organização, da limpeza, enfim, o gerenciamento dito “doméstico” – não é uma punição individual ou histórica de qualquer forma, mas simplesmente um reconhecimento ativo da necessidade coletiva de reprodução da militância. “O trabalho de organização também é resistência” – e também é essencial para a continuidade material das organizações. Uma das tarefas históricas dos comunistas é retirar a tarefa de reprodução da vida do âmbito da família (e dos ombros das mulheres) e a tornar coletiva;

“A economia comunista acaba com a família. No período da ditadura do proletariado (…) a família perde seu significado enquanto uma unidade econômica. As funções econômicas externas da família desaparecem, e o consumo deixa de ser organizado sob uma base individual familiar, uma rede de cozinhas sociais e cantinas é estabelecida, e o preparo, reparo, a lavagem das roupas e outros aspectos do trabalho doméstico são integrados na economia nacional. No período da ditadura do proletariado a unidade econômica da família deverá ser reconhecida como sendo, pelo ponto de vista da economia nacional, não apenas inútil, mas danosa. A unidade econômica da família envolve (…) o trabalho improdutivo, especialmente das mulheres, em casa – e, portanto, está em conflito com os interesses da república dos trabalhadores em um único plano econômico e no uso adequado da força de trabalho (incluindo as mulheres).” (Kollontai, 1921)

Da mesma forma, ao pensar nas relações de camaradagem como um ensaio das relações emancipadas futuras, isto é, como um ensaio do devir, deve-se ter em mente os esforços de uma nova divisão revolucionária do trabalho. O trabalho militante é, sim, exaustivo, e adoecedor, porque nos encontramos e nos reconhecemos no cerne das contradições que estruturalmente lutamos para superar. Sendo o trabalho organizativo também essencial para a manutenção da militância em geral – e, da mesma forma, não tendo sentido sem ela – a necessidade de encararmos a divisão revolucionária do trabalho como uma possibilidade do devir se mostra latente. Em discurso para a I Conferência Nacional da Mulher Moçambicana, em 1973, Samora Machel afirma:

“Assumir e viver a linha exige o engajamento nas tarefas traçadas pela Organização. Como a planta para se desenvolver necessita de se enraizar na terra, a linha enraíza-se na prática revolucionária. É a prática revolucionária que destrói a sociedade exploradora, é ela que desencadeia o combate interno, faz desmoronar as concepções erradas que trazemos, é ela que liberta o nosso sentido crítico e iniciativa criadora.” (Machel, 1973).

Homens sendo, geralmente, mais incentivados a tarefas de formulação, acabam por encarar as questões organizativas materiais como dadas a priori, sem nenhum trabalho militante envolvido. Nesse sentido, podemos pensar esse fenômeno como um reflexo da invisibilidade do trabalho reprodutivo. O “produto” do trabalho reprodutivo da militância – que, na concretude, são processos em si mesmos e não produtos, como relatorias, bem-estar dos camaradas, espaços organizativos, a condução em si – adquire a aparência de algo inato. Tal como a organização doméstica aparece, dentro de uma divisão sexual do trabalho, como escondida em relação ao trabalho assalariado, esse trabalho de organização se molda em algo quase que “privado” na medida em que fica a cargo, majoritariamente, de mulheres – até mesmo quando estas não estão delegadas diretamente para funções de organização.[6]

Ao mesmo tempo que é necessário refletir, cada vez mais, sobre a responsabilidade do militante comunista dentro de suas organizações de classe a partir da compreensão da responsabilidade do sujeito histórico revolucionário comunista na construção da emancipação humana, é importante também o entendimento de como são forjados o militante em sua especificidade e o sujeito histórico dentro da totalidade. Sem isso, corre-se o risco de: 1. Se forjar um punitivismo feito de escracho público e de culpa, em um lugar onde a construção deve ser de camaradagem e ações disciplinares com claro objetivo revolucionário; 2. Responsabilizar mulheres, exclusivamente, pela educação de homens e proteção de outras mulheres.

Novamente, no Caderno de Teses do Coletivo Feminista Classista Ana Montenegro de 2015:

“114. Ao mesmo tempo entendemos que devemos aprofundar cada vez mais nossa formação sobre as questões de classe, gênero e raça não voltando atenção apenas sobre ações machistas e sexistas, propondo somente punição aos que as praticam, e deixando de avaliar outros aspectos da construção sociocultural que têm moldado os sujeitos. Essa atitude restritiva quanto às questões que tocam especificamente pode causar a divisão da luta e de nossas pautas, isolando a mulher como única responsável por combater as violências a que está cotidianamente submetida, deixando de problematizar o fato de que também cabe aos homens trabalhar para romper com o sistema patriarcal, machista e desigual dentro do qual todas e todos estão inseridos, agindo, portanto, para que os homens também assumam o feminismo classista como bandeira de luta universal.”

Saffioti afirma, ao falar sobre a participação das mulheres brasileiras em movimentos sociais e sindicatos, que mesmo compondo amplamente as bases, as mulheres raramente ocupam diretorias e lideranças, estando limitadas a funções menores. Compreende-se que isso é verdade, mas também que é necessário ir além. Em diversas formas de organização dos movimentos sociais, organizações de classe, entidades estudantis e sindicais, a natureza do que se chama de tarefa ou cargo dirigente diferem. É importante que seja observado atentamente qual a natureza da tarefa a ser cumprida, mas também lembrar que, para caminhar no sentido de uma divisão revolucionária do trabalho, não basta que mulheres sejam colocadas em cargos de direção simplesmente para ter “participação de mulheres em espaços políticos” (as tarefas de organização muitas vezes também se configuram como diretivas). É necessário que essas camaradas e companheiras sejam incentivadas e preparadas para uma atuação política que não as coloque, novamente, em uma posição apenas de cuidado e reprodução da militância, mas em pensar e elaborar a política de suas organizações de classe. O  feminismo classista tem a tarefa de não apenas melhorar as condições que as mulheres já ocupam, mas de as transformar.

Referências:

Goldman, W. Z. Mulher, Estado e Revolução. 2014, São Paulo: Boitempo Editorial.

Iasi, M. Olhar o mundo com olhos de mulher? À respeito dos homens e a luta feminista. 21/03/1991, Amsterdã. Disponível em:        https://marxismo21.org/wp-content/uploads/2012/07/mauro-iasi_feminismo.pdf

Kollontai, A. M. Mulher Trabalhadora e Mãe. 1916. Disponível em: https://www.marxists.org/portugues/kollontai/1916/mes/90.htm

Kollontai, A. M. Teses sobre a Moralidade Comunista na Esfera das Relações Conjugais. 1921. Disponível em: https://www.marxists.org/portugues/kollontai/1921/mes/90.htm

Lenin, V. I. A Contribuição da Mulher na Construção do Socialismo. 28/07/1919. Disponível em: https://www.marxists.org/portugues/lenin/1919/07/28.htm

Machel, S. M. A Libertação da Mulher é uma Necessidade da Revolução, Garantia de sua Continuidade, Condição de seu Triunfo. 04/04/1973, Moçambique. Disponível em: https://www.marxists.org/portugues/machel/1973/mulher/index.htm

Saffioti, H. I. B. Força de trabalho feminina no Brasil: no interior das cifras. Perspectivas: Revista de Ciências Sociais, v. 8, 1985. Disponível em: http://hdl.handle.net/11449/108258

Saffioti, H. I. B. O Poder do Macho. 1987, São Paulo: Moderna. Disponível em: https://www.mpba.mp.br/sites/default/files/biblioteca/direitos-humanos/direitos-das-mulheres/obras-digitalizadas/questoes_de_genero/safiotti_heleieth_-_o_poder_do_macho.pdf

Sousa-Lobo, E. A classe operária tem dois sexos: trabalho, dominação e resistência. Expressão Popular, 3ª edição, 1996. Disponível em: https://www.expressaopopular.com.br/loja/wp-content/uploads/2021/03/Classe-operaria-tem-dois-sexos.pdf

[1] Militante do Coletivo Feminista Classista Ana Montenegro e estudante de Agronomia na Universidade Federal do Paraná

[2] “(…)a condição de objeto privado [da mulher] concretiza-se como condição fundamental para a vida em sociedade nos moldes do capitalismo.” (Caderno de Teses do Coletivo Feminista Classista Ana Montenegro – Encontro Nacional de 2015, p. 19)

[3] Lass, M.E. Letícia Lanz propõe política pública voltada para o bem-estar social. Gazeta do Povo, Curitiba, 10 de outubro de 2020. Disponível em: https://www.gazetadopovo.com.br/eleicoes/2020/curitiba-pr/leticia-lanz-proposta-economia-do-cuidado/

Notas:

[4] Outro aspecto, a ser abordado futuramente, é a dimensão de negligência para com a formação teórica de mulheres e a criação de condições materiais para que se tornem formuladoras, agitadoras, propagandistas, enfim, que sejam intelectualmente incentivadas, levando em considerações aspectos psicológicos (de confiança e insegurança, por exemplo) e de sociabilidade das camaradas que podem se apresentar como empecilhos para seu desenvolvimento integral enquanto militante.

[5] Escolhemos não abordar com culpabilização e punitivismo essa maior aparição de homens em espaços públicos em detrimento de mulheres porque reconhecemos que isso não nos leva ao caminho que queremos chegar, enquanto possibilidade emancipatória. No caderno de Teses de 2015 do CFCAM: “113.  A luta não é contra os homens, nem contra um indivíduo singular, no entanto, são nas práticas individuais cotidianas de nossos camaradas que se manifestam comportamentos opressores e até violentos. Cabe-nos identificar, alertar e combater.”

[6] Isto é, mesmo quando não é sua função direta ou tarefa delegada dentro da estrutura organizativa, o “treinamento” que mulheres recebem durante toda a sua vida para ter a obrigação de cuidar e gerenciar, nos coloca quase que em uma posição de angústia ao não organizar o que é necessário – para além do senso de responsabilidade do militante revolucionário. Essa angústia gerada pela socialização sexista parece nos levar a formalmente pegar tarefas que homens, normalmente, por estarem inseridos na já mencionada divisão sexual do trabalho, não se prontificam a assumir.

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2 comentários em “Sobre a reprodução da militância, as tarefas organizativas e a divisão sexual do trabalho – “olhar o mundo com olhos de mulher””

  1. Adorei o texto, parabéns. Entre as questões que me veio uma é: o que exatamente vc quis dizer com:
    … compreendendo que esse trabalho é um trabalho não pago, há algo de moral em saber cuidar, há algo inato nessa essência que nos permite zelar pelos outros…

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  2. Olá camarada! O trecho se refere à fala mencionada da Leticia Lanz, mas também a compreensão geral que certos setores do movimento feminista tem sobre o trabalho doméstico. Mesmo compreendendo que o trabalho doméstico é um trabalho não pago, que pesa sob os ombros das mulheres trabalhadoras, esses setores ainda colocam uma superioridade moral nesse trabalho exaustivo – por exemplo, na ideia de “mulher guerreira”, mas também quando se afirma que é devemos colocar mulheres em espaços de poder porque elas “sabem cuidar das pessoas” (e não por seu desenvolvimento e programas políticos, ou pela necessidade de colocar o feminismo no centro da análise e disputa de poder.) Dessa forma, o discurso de economia de cuidado e de moralidade ainda mantém a ideia que é algo positivo que mulheres ocupem esse lugar na divisão sexual do trabalho.

    Existem outras problemáticas também, que envolvem romantizar a exaustão mental que vem do trabalho doméstico, por exemplo afirmando que mulheres são “mais evoluídas” por conseguirem fazer várias coisas ao mesmo tempo – sem perceber também que isso reafirma o discurso da chamada “inutilidade masculina”. Uma análise mais completa e mais material disso deve ser feita também, mas essa foi a ideia geral do trecho.

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