Por John Foster, via Morning Star, traduzido por Konrado Leite
A história pode ser frequentemente escrita pelos vencedores, mas um relato dos sucessos e defeitos da República Democrática Alemã restaura algum equilíbrio.
[Resenha do livro: Estado policial ou paraíso socialista: A República Democrática Alemã e o que aconteceu com ela, por Bruni de la Motte e John Green.]
A República Democrática Alemã desapareceu em 1990. Tudo o que resta hoje são memórias. A conclusão do livro anterior de Bruni de la Motte e John Green sobre a RDA baseou-se nessas memórias para permitir que uma série de pessoas — um mecânico de automóveis, uma arquiteta, uma trabalhadora rural, uma médica — falassem sobre si mesmas.
O resultado desafiou os estereótipos da guerra fria. A RDA não era um inferno nem uma utopia. Ela alimentou esperanças de uma nova ordem social mais humana, mas também restringiu tais esperanças.
Na introdução de seu novo livro, os autores destacam a importância da experiência da RDA, tanto positiva quanto negativa, para todos aqueles que buscam uma sociedade mais justa e socialista.
A construção de tal sociedade nunca será empreendida, como Marx poderia ter dito, em circunstâncias de nossa escolha. Em nenhum lugar isso foi mais marcante do que na RDA.
A RDA não foi criada como resultado de uma mobilização de massas da classe trabalhadora. Ela surgiu na esteira da guerra, na parte economicamente menos desenvolvida da Alemanha, que havia sido devastada, despovoada e sujeita a pesadas reparações.
É certo que setores da classe trabalhadora alemã lutaram heroicamente contra o fascismo, e que a chegada das tropas soviéticas a Berlim marcou, de certa forma, a conclusão de um quarto de século de luta antifascista.
Aconteceu também que referendos realizados em 1946 nos setores oriental e ocidental mostraram apoio majoritário à propriedade pública de grandes indústrias e serviços públicos, e a expropriação de grandes negócios que apoiaram os nazistas.
No entanto, a ideologia nazista estava profundamente enraizada, e a RDA esteve ao longo de seus 40 anos de história na linha de frente da guerra fria, sujeita a um bloqueio econômico tão prejudicial quanto o contra Cuba, e enfrentando tentativas sistemáticas de desestabilização e subversão.
Portanto, foi notável que a RDA tenha alcançado tanto quanto alcançado. Uma pesquisa realizada entre seus ex-cidadãos, em 1998, descobriu que as coisas negativas que eles associavam à RDA eram: restrições a viagens (62%), escassez de bens de consumo (42%) e domínio do Partido Socialista Unificado (38%), mas que a espionagem da Stasi marcou apenas 5%.
As associações positivas eram consideravelmente mais fortes – pleno emprego (89%), segurança social (85%), oportunidades para mulheres (82%) e satisfação no local de trabalho (65%). Uma pesquisa mais recente descobriu que mais de 80% achavam que a vida era melhor na RDA do que desde a unificação.
Os autores enfatizam os aspectos perniciosos da estrutura política da RDA – que a liderança nunca perdeu seu medo de “atividades anti-estado, rebelião e contrarrevolução”, que seu sistema formalmente multipartidário permaneceu subordinado à liderança de um partido, e que a tutela soviética envolvia sérias consequências negativas para a democracia interna do próprio Partido Socialista Unificado.
No entanto, eles também enfatizam os altos níveis de participação informal na tomada de decisões em nível local, e a profundidade da democracia econômica da RDA. A diferença na renda [entre os trabalhadores mais ricos e os mais pobres] era de 1:3, contra 1:12 na Alemanha Ocidental. A segurança no local de trabalho e um dos melhores serviços sociais da Europa deram às pessoas confiança para desenvolver suas próprias vidas.
Havia também o legado do passado nazista. A RDA realizou uma desnazificação total, enquanto no ocidente oficiais nazistas continuaram a dominar o aparelho de segurança e o judiciário. 10.000 pessoas foram presas na Alemanha Ocidental na década de 1960 por associação com o proibido Partido Comunista e organizações de paz.
Como Seumas Milne escreve em seu prefácio, a história é frequentemente escrita pelos vencedores. O grau em que a RDA ainda é demonizada no Ocidente indica que sua tentativa de construir o socialismo continua sendo um desafio para o capitalismo contemporâneo, e uma experiência com a qual devemos aprender.
Os autores estão de parabéns por fornecer um relato equilibrado e bem-informado.
2 comentários em “Nem um paraíso socialista, nem um inferno policial”
Quais são as fontes das pesquisas?
Ah perdão, é uma resenha de um livro não tinha visto esse começo.